Uma política de prevenção não é privilégio de grandes companhias, nem está necessariamente atrelada ao volume de recursos financeiros disponíveis. Ela depende do reconhecimento, por parte dos dirigentes e dos trabalhadores, de que o consumo de drogas existe e pode afetar a produtividade, a segurança e as relações interpessoais no ambiente de trabalho. A partir daí a organização pode e deve definir de forma pragmática o que é aceitável ou não em relação ao consumo de drogas por seus colaboradores, as ações de prevenção e o tipo de suporte a ser oferecido para aqueles que já apresentam algum comprometimento decorrente do consumo de qualquer tipo de droga, inclusive o álcool.
Embora a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) arcaicamente ainda legisle sobre a dispensa por justa causa para ?embriaguez habitual ou em serviço?, a demissão sumária do trabalhador com problemas decorrentes do uso do álcool e outras drogas vem perdendo força. A substituição pura e simples não garante solução, já que entre 10% e 12% da população economicamente produtiva, acima de 14 anos, tem problemas de abuso ou dependência de algum tipo de droga.
Terão maior sucesso as ações voltadas à abordagem multidisciplinar, capazes de ser implementadas em conjunto pelos profissionais de recursos humanos, saúde ocupacional e segurança. Devem envolver fortemente as lideranças e as chefias, a representatividade legítima dos trabalhadores e articular-se com a rede de recursos comunitários, especialmente os serviços da rede pública de saúde.
Pressupostos de uma política de prevenção no ambiente de trabalho
A elaboração de uma política eficaz para o ambiente de trabalho deverá necessariamente considerar alguns pressupostos norteadores de ações e estratégias de intervenção, de acordo com as ideias de alguns estudiosos e profissionais que desenvolvem ações de prevenção do uso de drogas no ambiente de trabalho. São elas:
- Reconhecimento de que o consumo de drogas lícitas e ilícitas no ambiente de trabalho é um problema de saúde e de segurança que requer, por parte da organização, posicionamento claro, realista e desprovido de preconceitos;
- Reconhecimento de que organização e trabalhador devem compartilhar a responsabilidade na busca de alternativas;
- Reconhecimento de que os quadros de abuso e dependência de drogas são passíveis de tratamento;
- Reconhecimento de que existe várias possibilidades de abordagem e modelos de tratamento;
- Reconhecimento do papel da família como fator de proteção do uso de drogas e suporte à recuperação e à reinserção social do trabalhador;
- Reconhecimento de que existe uma rede de recursos e serviços de saúde na comunidade e de que as ações da organização devem prever a articulação e o fortalecimento do trabalho em rede;
- Garantia de que a natureza das ações a serem implementadas pela organização seja de conhecimento de todos (direção, profissionais que executam o programa, chefias e trabalhadores);
- Garantia de confidencialidade para os trabalhadores usuários abusivos ou dependentes que desejarem receber ajuda;
- Garantia de que trabalhadores que buscam ajuda no programa de prevenção não sofrerão prejuízos em sua ascensão funcional.
Aspectos positivos das ações de prevenção no ambiente de trabalho:
Para o trabalhador:
- Acesso a informações adequadas sobre drogas e seus efeitos;
- Oportunidade de reflexão e ajuda profissional para alteração de seu padrão de consumo;
- Oportunidade de reflexão e ajuda profissional para mudança de seu estilo de vida;
- Participação proativa em ações de promoção da saúde e segurança no trabalho.
Para a organização:
- Maior comprometimento dos trabalhadores;
- Melhoria da imagem como organização socialmente responsável (no mercado e na comunidade);
- Redução de custos relacionados à saúde e à segurança;
- Aumento da produtividade;
- Redução do número de acidentes no trabalho;
- Redução do turn over e do absenteísmo*.
Modelos de prevenção
Abordagem |
Foco |
Método |
Socialização de informações sobre drogas. |
Ampliação do conhecimento sobre os diversos tipos de substâncias, seus efeitos e suas consequências. Promoção de atitudes de mudança de entendimento sobre o uso de drogas. |
Palestras, discussões, áudio ou vídeo, pôsteres, panfletos, mensagens eletrônicas, mensagens em demonstrativos de pagamentos, jornal interno. |
Educação afetiva. Desenvolvimento de habilidades pessoais e sociais. |
Melhoria da autoestima.
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Palestras, discussões, dinâmicas de grupo para desenvolvimento pessoal e resolução de problemas. |
Criação de alternativas ao uso de drogas. |
Melhoria da autoestima. Autoconfiança. Redução de condições de estresse, pressão e alienação. |
Organização e desenvolvimento de atividades de lazer, de convivência, recreacionais e culturais; participação em projetos de serviço comunitários; orientação profissional. |
Desenvolvimento de habilidades de enfrentamento ao uso de drogas. |
Desenvolvimento de habilidades para enfrentar a pressão social para o uso de drogas. Ampliação do conhecimento sobre as consequências negativas imediatas. |
Discussões em grupo, dramatização, atividades monitoradas por profissionais especialistas em prevenção. |
* Turn over é o movimento de entradas e saídas, admissões e desligamentos de profissionais empregados de uma organização.
* Absenteísmo é a ausência do trabalhador ao serviço quando se esperava que ele estivesse presente.
Fonte: CRUZ, Déborah D. de Oliveira; DUARTE, Paulina do Carmo A. V.; TROIAN, Sandra M. de Lima.Texto adaptado do original do curso Prevenção do uso de álcool e outras drogas no ambiente de trabalho: Conhecer para ajudar. 3 ed. ? Brasília: Ministério da Justiça. Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas - SENAD, 2012.